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segunda-feira, 24 de março de 2014

Arborização decorativa não atende Palmas

21/03/2014 08h30

Ademir dos Anjos
Por Rubens Gonçalves


“A humanização da cidade compreende a adaptação do espaço urbano a uma condição aprazível para o convívio e usufruto dos cidadãos com qualidade de vida, através de arborização urbana adequada, condições de mobilidade e acessibilidade urbana sustentável e espaços para o exercício da cidadania, conservando e preservando o meio ambiente”. É o que diz o artigo 9° da Lei Complementar 155/2008, que dispõe sobre o Plano Diretor de Palmas.

Para especialistas, porém, é grande a distância entre a previsão legal e a realidade. As boas cidades, para eles, são a mescla do natural e do construído; e as árvores “são as rainhas do mundo natural”, a serviço dos moradores, com importantes funções também nas cidades. Desta forma, elas precisam ser vistas e cuidadas.

Mas em Palmas, a arborização e o paisagismo em geral – para os gestores – têm função meramente decorativa. Desde a implantação da cidade, em 1989, até hoje se plantam árvores e palmeiras “importadas”, inadequadas ao clima local, que vai do sol escaldante a chuvas torrenciais.

Exemplos disso são as palmeiras imperais (principalmente nas avenidas LO-01, “rua do Seturb” e JK) e as flores que enfeitam canteiros e rotatórias na região central da cidade. “Essas florzinhas, modelo ‘importado’ de Goiânia, são insustentáveis”, critica Luis Hildebrando Paz, arquiteto e presidente da Associação de Conservação do Meio Ambiente e Produção Integrada de Alimentos da Amazônia (Gaia).

O agrônomo Ramis Tetu é ainda mais categórico nas críticas ao modelo de arborização e paisagismo adotado na Capital. Para ele, limita-se a decorar espaços de passagem de carros. “É triste, pois temos bons parâmetros no Brasil, custa menos fazer o certo e é relativamente fácil mudar para um novo modelo com bases sustentáveis. Mas este modelo predomina na maioria das cidades brasileiras, não é um equívoco apenas nosso”, pondera.

O agrônomo diz ainda que o modelo palmense de paisagismo, historicamente, falha nas principais dimensões da sustentabilidade – ambiental, social, econômica e gerencial – priorizando uma visão “apenas decorativa, elitista e cara da jardinagem”. Para ele, há uma confusão leiga sobre as funções do paisagismo de áreas públicas e de jardins privados.

Outra crítica que se faz é a facilidade com que se derrubam árvores na cidade, com justificativas desprovidas de qualquer fundamento, como destacar a fachada de uma loja ou facilitar a visão para um outdoor. “Isso é um atentado à qualidade de vida da nossa cidade, uma visão ‘urbanóide’ de progresso – pois o excesso de concreto e asfalto não traz qualidade de vida e a boa cidade equilibra uma mescla harmonizada do natural (qualificado) com o construído – nos lotes privados, comerciais e institucionais, nas vias públicas, não só nas áreas verdes”, explica Tetu.

Sem essa perspectiva, a cidade não tem árvores suficientes nos estacionamentos, em muitas rotatórias, ao lado de prédios públicos, na Praça dos Girassóis, proximidades dos shoppings e de estações de ônibus, e nem mesmo no campus da Universidade Federal do Tocantins (UFT).

Durante o Congresso Brasileiro de Arborização Urbana, realizado em Palmas no ano passado, a prefeitura alegou que um dos motivos para não plantar mais árvores nas ruas e avenidas seria o fato de esses locais, muitas vezes, estarem “inacabados.” Porém, para Luis Hildebrando, com planejamento é possível arborizar, mesmo sendo “uma cidade em construção”.

Clima

As árvores são um equipamento multifuncional. Tetu explica que elas não são “só meio ambiente”, pois marcam a paisagem da cidade e sua identidade, mais do que prédios. “Entre outras coisas, são o verdadeiro ar condicionado da cidade, filtro de poeira e ruídos, promovem sombra – que é o primeiro fator de acessibilidade em calçadas, ciclovias e áreas de estar e convívio -, atraem pássaros, que atraem turistas”, enumera.

Estudo realizado por Luis Hidelbrando, resultado de uma dissertação de mestrado pela UnB, revelou outro benefício da arborização urbana em Palmas: a melhora do clima. Para se ter ideia, à noite a diferença chega a quase dez graus entre locais próximos a áreas verdes – como o Parque Cesamar – e a Avenida JK.

Outro exemplo, dado por ele, é que uma árvore adulta e frondosa produz até 400 litros de água (em forma de umidade) ao seu redor, tendo, portanto, um efeito refrescante. “Ruas arborizadas não deixam a luz solar incidir sobre o asfalto. A falta delas, ao contrário, deixa o sol chegar ao asfalto e faz o calor se espalhar”, exemplifica.

Dados disponíveis no site Vida Sustentável mostram que o efeito de resfriamento do ar de apenas uma árvore é equivalente a dez aparelhos de ar condicionado funcionando durante 24 horas por dia. “A árvore reduz a temperatura do ar através da sombra, aumentando a umidade em climas secos por evaporação da umidade e reduzindo a velocidade do vento”, diz o texto.

Tetu completa acrescentando que a proximidade da natureza é um ato de saúde (muito desconsiderado no urbanismo), e por isso “todas as cidades do mundo que são consideradas boas, desenvolvidas, parecem florestas vistas de cima”.

Soluções

Uma das soluções, para Tetu, seria um plano de paisagismo sustentável, com parques, praças, arborização urbana; além da tecnificação do setor, com critérios próprios que defina as verdadeiras prioridades da área.

Para Hildebrando, o poder público precisa fazer sua parte, inclusive incentivando a população a plantar e cuidar de árvores e jardins em suas calçadas e quintais. Para isso, o Plano Diretor da Capital prevê o IPTU Ecológico – desconto para quem plantar mudas de árvores, de preferência de espécies nativas.

O artigo 79 da lei que institui o IPTU Ecológico do município diz que ele é instrumento de planejamento, como estímulo à conservação, preservação e recuperação do meio ambiente urbano.

Ainda segundo a lei, os incentivos, características e atributos ambientais a serem considerados para aplicação do IPTU Ecológico serão especificados e regulamentados “por lei específica”. Cabe, portanto, à prefeitura de Palmas regulamentar esse e outros dispositivos previstos no Plano Diretor.

Outro lado

A secretária municipal do Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, Germana Pires Coriolano, informou à reportagem que está buscando recursos junto ao Ministério do Meio Ambiente para um amplo projeto de arborização na Capital. (Texto publicado originalmente no Jornal Stylo)

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